Sinopse: O
Retrato de Dorian Gray é o único romance do escritor irlandês Oscar
Wilde, autor de inúmeras peças de teatro e histórias curtas. O romance, que
conta a insólita história de um jovem londrino cuja beleza tornou-se sua
própria miséria, provocou violentos debates e intensa polêmica ao ser
publicado, em 1891, por retratar de maneira dramática a degradação do homem.
Hoje, passadas as paixões da época, verifica-se que, pelo apuro estilístico,
humor, fantasia e verve - nele se encontram alguns dos mais famosos e
cintilantes paradoxos de Wilde —, o livro resistiu à ação do tempo. E que,
superado o seu espírito aristocrático e até antipopular, a esse doloroso
apólogo da degradação humana jamais faltaram emoção estética e grandeza
dramática. Wilde dizia haver posto todo o seu gênio em sua vida, todo o seu
talento em seus trabalhos. Deu à ribalta inglesa as melhores comédias desde
Sheridan, todas cheias de excelentes situações, repletas de estilo singular, de
graça suave. Brilhante classicista, foi ainda um prosador singular, com
trabalhos marcados por certo exotismo, evidentemente influenciado pelas obras
de Walter Pater, cujas teorias estéticas aceitou, dizendo cultuar a arte pela
arte. Colecionava objetos de porcelana azul, penas de pavão, e defendia o uso
de roupas "racionais" pelas mulheres - o que significava vestidos
soltos e a ausência de espartilhos. Proclamava-se ainda socialista, embora se
preocupasse mais com a liberdade artística do que com a igualdade social.
A
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vida de Dorian Gray poderia dar inveja a qualquer jovem de considerável beleza e fortuna. Afinal, no mundo das aparências, um rosto angelical, um sorriso encantador e olhos brilhantes nos leva a fazer julgamentos sobre o caráter alheio. Julgamos que alguém bem vestido, com boas maneiras e rosto jovial seja incapaz de cometer grandes atrocidades. Afirmamos pertencer àqueles desafortunados a vulgaridade da vida e dos atos hediondos. E, por outro lado, quantas vezes, ao longo da vida, nos deparamos com lobos em peles de cordeiro? O mundo está cheio delas.
Com
Dorian Gray não foi diferente. Dono de uma beleza invejável, o jovem Dorian,
com apenas vinte anos, ainda conservava em si a ingenuidade adolescente e a
vitalidade inocente. Por infortúnio um dia aceitou que lhe pintassem um retrato
seu, e dessa forma seus problemas futuros tiveram início.
Conforme
avançamos na leitura, descobrimos que Dorian, ao contrário do que muitos
supostamente pensaram, não teve uma vida fácil e amorosa. Sim, sempre fora rico
e pertenceu a alta sociedade britânica do século XIX, entretanto, sua criação
não teve a excelência do amor, do afeto e do cuidado, tão importantes para a
formação de qualquer ser humano. A impressão que me deu foi que Gray já cresceu
com indícios de seu caráter maculado, mas isso só se manifestaria mais tarde.
O famoso
retrato que culminou com uma terrível tragédia em sua vida não foi de certo a
causa central, e sim a influência de duas personagens fundamentais: o pintor,
Basílio Hallward, e seu amigo Lorde Henry Wotton. Basílio, ao descobrir a
intrigante beleza de Dorian, enamorou-se dele. Criou para si um amor platônico
a partir da presença marcante de sua fonte de inspiração. Lorde Henry Wotton,
um homem cínico, diferentemente do amigo pintor, enamorou-se pelo rapaz pelo
fato de ele conter tudo aquilo que desejava na vida: uma beleza encantadora, a
jovialidade arrebatadora. Não se trata, portanto, da busca de riqueza e poder,
algo que o lorde detinha em suas mãos. O que tornaria, para Lorde Henry Wotton,
Dorian mais desejável, seria sua alma imaculada; seus desejos reprimidos; seus
traços castos e honrosos. Nada mais o entediava do que isso. Considerava tais
aspectos a hipocrisia da época.
Não
demorou muito para que Lorde Henry incutisse na cabeça de Dorian suas teorias,
perspectivas e visão de mundo a respeito dessas questões. Ele desejou e agiu
para que o menino experimentasse todos os prazeres que a vida, e a vida dos
afortunados, podia oferecer. Tornou-se sua obsessão. E Dorian, inconsequente,
tomado pela súbita vaidade que o infligiu de repente, cobiçou ardentemente
conservar sua beleza e jovialidade para que seu retrato, onde ocupava o mais
belo de si, envelhecesse e carregasse as marcas da devassidão, do pecado, da
vida desregrada. E assim o pacto foi feito.
Valeria a
pena macular à alma em troca de uma vida de prazeres e despojamentos?
Valeria a
pena esquecer-se do passado, e entregar-se de forma desmedida e inconsequente,
aos mais absurdos e sórdidos vícios sem que isso imponha marcas ao corpo
material?
Seríamos
capazes de manter nossa consciência sempre limpa de todos os erros
cometidos?
Seria o
fim da culpa?
As
transgressões seriam apenas apagadas da memória?
As
máscaras da vida social, travestida de responsabilidade, compromisso, respeito,
honra e dignidade daria conta de ocultar todas as perversões cometidas?
A partir
da leitura dessa maravilhosa obra de Oscar Wilde, questões como as escritas
acima passaram pela minha cabeça. O preço e o risco talvez sejam altos em
demasia. Penso que o fato de Dorian ter tido a curiosidade de experimentar
prazeres então reprimidos pela sociedade não seja o grande problema. Acho,
inclusive, que é preciso sim ultrapassar os limites de certas questões
envolvidas pelo moralismo, que no Brasil é ditado pela ética cristã, em sua
maioria. Contudo, é necessário haver maturidade de quem ultrapassa tais
limites, pois há outros limites e caminhos que podem corromper o ser humano,
tomando-lhe a dignidade e a vida. O que poderia ser apenas uma busca pela
liberdade, corre o risco de transforma-se em um ciclo vicioso de escravidão.
Não acredito que alguma máscara possa sustentar isso de forma inabalável para
sempre.
O livro é
belíssimo. O que mostro na imagem é uma edição de 1975 que eu adquiri em um
sebo por R$ 15,00.
Eu não
tinha ideia do quanto iria me divertir lendo-o. Foi realmente muito bacana.
Acredito que muitos debates possam surgir a partir de temas tratados pelo
autor, e o culto à beleza, não somente ao que é belo, e sim as aparências e
julgamentos errôneos que fazemos, se coloca como algo muito atual.
Recomendo
;)
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